O melhor texto sobre a crise na Geórgia é-nos trazido pelo Manuel Azinhal, que desassombradamente expõe o cinismo da liderança russa e a ingenuidade do eurasismo. O imperialismo russo tem a mesma face militarista e expansionista dos Estados Unidos e, empurrado pela favorável conjuntura económica, vai mostrando as suas garras. Putin, que se formou no KGB, sabe-a toda. Triste, claro, a contradição do discurso americano, apoiando a dissidência do Kosovo e apanhado por idênticas reividincações pelos russófonos da Abecásia e da Ossétia do Sul.
Merece uma lembrança a tragédia de Zviad Gamsakhurdia, nacionalista, herói da independência georgiana (e da resistência ao comunismo nos anos Brezhnev), primeiro presidente eleito, afastado por um golpe apoiado pelos russos e morto em condições ainda não esclarecidas. Para lembrar que, mesmo com Ieltsin, a agressividade russa só estava limitada pela deplorável situação económica; de resto, na Transnistria (território moldavo com maioria de população de origem russa) ou na Chechénia o urso ia afiando as suas garras. Putin, mais cínico e frio que Ieltsin, eliminou o nacionalista Djokhar Dudaiev e deu um forte impulso aos islamistas, que passaram a ser os supostos defensores da independência da Chechénia, por essa altura presa do expansionismo verde e do Kremlin; o genial arquitecto da paz de 1996, e forte candidato à sucessão de Ieltsin, homem com carisma e credibilidade, Alexander Lebed, morrera entretanto num estranho acidente de helicóptero…